Publicações - 28/02/20
Audiência Pública no Supremo Tribunal Federal discute o controle de dados de usuários no exterior, no âmbito do Acordo de Assistência Jurídica Mútua entre Brasil e EUA.
Em 10 de fevereiro de 2020, o Supremo Tribunal Federal realizou audiência pública determinada no âmbito da Ação Declaratória de Constitucionalidade 51 – ADC 51, ajuizada pela Federação das Associações das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação.
A ação constitucional possui por objeto, segundo sua petição inicial, assentar a constitucionalidade de dispositivos do Código de Processo Civil e Penal, nos artigos que são referentes à cartas rogatórias, e do Decreto Executivo 3.810/2001, o qual internalizou o Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal (“MLAT”) entre o Brasil e os EUA.
Esses dispositivos não estariam recebendo aplicação pelas cortes infraconstitucionais, sob o entendimento de que as entidades filiais localizadas no Brasil, como Facebook e Google, exerceriam controle suficiente dos dados armazenados em suas redes, mesmo que eles estejam em servidores de matrizes ou outras filiais sediadas fora do Brasil, de modo que deveriam atender ordens judiciais para disponibilização desses dados, dispensado o uso de rogatórias e MLATs. Por essas decisões, a negativa de atendimento dessas ordens judiciais representaria violação à soberania nacional.
Como exemplo dessas decisões, a Federação autora citou a decisão em questão de ordem da Corte Especial do STJ no Inquérito 784/DF, proferida em 14 de abril de 2013. Na oportunidade, restou reconhecido que as empresas de tecnologia instituídas e atuantes no Brasil ficam submetidas à lei brasileira, sendo que os dados que armazenam não podem se sujeitar à política de Estado ou de empresa estrangeiras. A partir dessa decisão, o STJ assentou sua jurisprudência nesse sentido, como demonstrou também a autora da ação.
Na ADC, a Autora defende que, para obtenção de dados localizados no exterior, o Poder Judiciário deve, primeiro, solicitar cooperação jurídica internacional do país no qual os dados estão armazenados, para que este país emita a ordem de quebra de dados à empresa provedora, na forma de sua própria legislação, reconhecendo-se a constitucionalidade, nessas hipóteses, do MLAT e dos dispositivos processuais penais e civis.
Na audiência pública, foram ouvidos mais de vinte representantes de empresas de tecnologia, especialistas sobre o tema e autoridades públicas, os quais divergiram sobre a constitucionalidade do acordo. Representantes do Facebook, por exemplo, defenderam que a empresa está sujeita à legislação dos Estados Unidos sobre proteção de dados localizados em seus provedores, de modo a estar proibida em divulgar seus dados sem ordem judicial válida naquele país. De mesma forma, representantes da Yahoo Brasil defenderam que somente é possível implementar uma ordem de coleta de dados com a concordância do país no qual os dados estão armazenados.
Por outro lado, o Ministro da Justiça Sérgio Moro sustentou que o acordo impossibilita a obtenção de dados localizados no exterior, dado que os pedidos de cooperação internacional por muitas vezes não restam cumpridos, prejudicando o objeto do processo.
Ademais, defendeu que a postura adotada pelos tribunais não desrespeita o MLAT em questão, uma vez que o instrumento se destina a facilitar a obtenção de prova, e não impedir. Por fim, ressaltou que os tribunais devem observar o artigo 11 do Marco Civil da Internet, o qual estabelece que em qualquer operação de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, de dados pessoais ou de comunicações por provedores de conexão, deve respeitar a legislação brasileira.
A Ação Declaratória de Constitucionalidade ainda não possui data para sua inclusão na pauta do Supremo Tribunal Federal, e segue sob a relatoria do Min. Gilmar Mendes.