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Publicações - 22/06/21

Consequências da Regulamentação do Novo Marco Legal do Saneamento

O novo marco legal do saneamento que foi introduzido pela Lei nº 14.026/2020, publicada em 16 de julho de 2020 no Diário Oficial da União (“DOU”), tem como alguns dos pontos relevantes a extinção dos chamados contratos de programa (celebrados sem a realização prévia de processo licitatório) e a obrigatoriedade da previsão de metas de desempenho e de universalização dos serviços nos contratos que deverão, por sua vez, atender os requisitos da comprovação da capacidade econômico-financeira dos prestadores de serviços públicos de abastecimento de água potável ou de esgotamento sanitário.

A metodologia que deverá ser observada para a comprovação da capacidade econômico-financeira ora mencionada foi regulamentada pelo Decreto nº 10.710/2021, publicado no DOU no 1º dia deste mês de junho, sendo composta por duas fases sucessivas que envolverão a apresentação de documentos e informações para aprovação das autoridades reguladoras competentes até 31 de dezembro de 2021. A primeira fase funcionará como triagem sendo necessária a aprovação para que a empresa possa participar da segunda fase. O prazo previsto para conclusão do referido processo de comprovação de capacidade econômico-financeira, inclusive em relação a eventuais decisões a recursos administrativos, é até 31 de março de 2022.

Na primeira fase serão analisadas as demonstrações financeiras contábeis consolidadas do grupo econômico ao qual cada prestador pertencer, devidamente auditadas e referentes aos últimos 5 (cinco) exercícios financeiros exigíveis com a finalidade de apurar o cumprimento dos índices referenciais mínimos dos indicadores financeiros, definidos no referido Decreto como (i) índice de margem líquida sem depreciação e amortização superior a zero; (ii) índice de grau de endividamento inferior ou igual a um; (iii) índice de retorno sobre patrimônio líquido superior a zero; e (iv) índice de suficiência de caixa superior a um.

Na segunda fase deverão ser apresentados os estudos de viabilidade a fim de demonstrar estimativa de investimentos necessários para atingir as metas de universalização para contrato regular em vigor de abastecimento de água potável ou de esgotamento sanitário e investimento global adaptado às metas de universalização. Para aprovação na segunda fase, será analisada a compatibilidade de todos os documentos apresentados entre si, além da necessária comprovação, a partir da apresentação de estudos de viabilidade, de um fluxo de caixa global com valor presente líquido igual ou superior a zero.

As entidades reguladoras deverão emitir decisões fundamentadas a respeito da comprovação ou não da capacidade econômico-financeira do prestador de serviços, sendo que as conclusões indicadas nos laudos, estudos e demais documentos apresentados pelos prestadores de serviços, não vinculam obrigatoriamente as entidades reguladoras, as quais poderão, portanto, basear as suas conclusões em outros documentos e informações aos quais tenham acesso.

Em relação aos prestadores que não lograrem êxito na comprovação da sua capacidade econômico-financeira, nos termos do Decreto ora estudado: (i) os contratos de programa de prestação de serviços públicos de abastecimento de água potável ou de esgotamento sanitários serão considerados irregulares, não podendo os serviços continuarem a ser prestados com base em tais contratos; e (ii) não poderão ser celebrados os necessários termos aditivos para inclusão das metas de universalização dos serviços, mencionadas no início deste artigo, ficando impedida também a consecução da prestação de serviços.

Com a referida regulamentação vieram os posicionamentos divididos do setor público e privado. As empresas estatais que prestam os serviços de abastecimento de água potável ou de esgotamento sanitário com base em contratos de programa podem ser identificadas como as principais afetadas e, embora não tenha sido verificado, por enquanto, o acesso ao Poder Judiciário, é conhecido o descontentamento dessas empresas, principalmente, com o prazo que se encerra em dezembro de 2021 para entrega da documentação às autoridades reguladoras e com a impossibilidade de prorrogação dos contratos de programa vigentes como mecanismo de comprovação da capacidade econômico-financeira exigida.

A percepção tem sido de a referida regulamentação ser uma expressão da intenção de desestatização desse tipo de prestação de serviço por parte do Governo Federal, que considera como premissa que a exigência da comprovação econômico-financeira funcionará como triagem para quais empresas estatais conseguirão se manter na qualidade de prestadoras de abastecimento de água potável ou de esgotamento sanitário e quais perderão esses contratos, sendo que para algumas essa última hipótese resultará em privatização.