Publicações - 28/02/20
Airbus firma acordo de leniência bilionário com autoridades da França, Reino Unido e Estados Unidos
Particularidades do caso da empresa europeia pode se tornar importante precedente para casos de corrupção no cenário internacional
Em janeiro de 2020, a fabricante de aeronaves com base em Toulouse admitiu uma série de alegações de corrupção e suborno em relação às práticas de vendas de aeronaves da empresa, assim como conduta que continha violações civis de exportações relacionadas ao Regulamento Internacional de Tráfego de Armas (ITAR). As alegações de corrupção são baseadas em uma investigação internacional conduzida por promotores de diversas jurisdições. As alegações foram de que a empresa fez pagamentos ilícitos para ganhar grandes contratos ao redor do mundo, e a dissimulação teria ocorrido por meio de contratos fraudulentos, faturas falsas por serviços não executados e relatórios de atividades falsos.
A Airbus chegou a um acordo com as autoridades britânicas, norte-americanas e francesas, comprometendo-se a pagar uma multa de € 3,598 bilhões de euros, de acordo com a declaração formal da empresa à imprensa. A multa é considerada a maior da história dos acordos envolvendo atos de corrupção.
Nesse sentido, os acordos foram firmados com três autoridades principais: o Serious Fraud Office do Reino Unido (SFO), a autoridade francesa Paraquat National Financier (PNF) e o Department of Justice dos EUA (DOJ).
As autoridades mencionadas são agências reguladoras internacionais que coordenam o combate a casos de corrupção que possam vir a causar danos à economia.
Um quarto acordo foi firmado com o Departamento de Estado dos EUA (DOS) e é um Acordo de Consentimento. O acordo estabelece que a Airbus deve resolver todas as violações civis das alegações contra o ITAR, além de manter um responsável de compliance independente para a área do controle de exportação, que irá monitorar a eficiência do sistema de controle de exportação da Airbus, assim como sua conduta frente ao ITAR.
Segundo o previsto nos mencionados acordos, a companhia deve pagar uma multa de € 2,083 bilhões à PNF, € 954 milhões à SFO, € 526 milhões ao DOJ e € 9 milhões ao DOS. Além disso, a empresa deve estabelecer um programa de compliance eficaz.
Este caso eleva a França ao status de novo agente no combate a corrupção no cenário internacional. Desde que a nova lei francesa anticorrupção – conhecida como Sapin II – foi introduzida no sistema jurídico do país, nenhuma empresa tinha sido, até então, condenada diretamente por atos de corrupção e quase não havia registos de casos de corrupção de repercussão internacional conduzidos por autoridades francesas.
A Lei Sapin II possui três princípios fundamentais: promover a transparência, fortalecer o combate a corrupção e modernizar a economia. A mencionada legislação estabeleceu uma forma de plea bargain no sistema jurídico francês, permitindo a negociação de benefícios caso haja confissão e reconhecimento de culpa, desde que a empresa se comprometa a reparar seus erros e a pagar multa, geralmente, com valores significativamente altos. Também inspirada no UK Bribery Act (lei anticorrupção britânica), aprovada em 2014, o Sapin II prevê penalidades criminais para grandes empresas que não tenha sucesso no combate a corrupção.
O caso da Airbus também será lembrado por duas particularidades relevantes. Primeiro, o alto nível de cooperação internacional, com alcance verdadeiramente global das investigações conduzidas, que resultou em um acordo substantivo firmado simultaneamente em todas as jurisdições envolvidas no caso. Em segundo lugar, este é considerado o primeiro caso a ser conduzido inteiramente pela tecnologia de software de codificação. A Airbus cooperou integralmente com as autoridades durante as investigações, disponibilizando mais de 30 milhões de documentos, que foram analisados com a tecnologia de software de codificação.